quinta-feira, 19 de abril de 2007

Linha tênue e imaginária...


Ontem foi dia de entrevista com pacientes de um hospital psiquiátrico. Faz parte da disciplina de psicopatologia.
É sempre, literalmente, uma loucura!
Percebo o pânico de alguns colegas, diante de uma realidade chocante e muito próxima de nós e de nossa pretensa sanidade mental. Ali você descobre que a loucura está dentro da gente, em espreita constante, e esperando para se revelar. É uma linha muito tênue a que separa os dois mundos, é dificil entrar em contato com essa nossa fragilidade, mais uma coisa que não temos o menor controle, uma chaga narcisista...
Por algum motivo havia no ar uma agitação fora do comum. As mulheres estavam alteradíssimas, e por isso não conseguimos entrar no pavilhão. No pavilhão masculino foi difícil encontrar um paciente que não estivesse agitado ou com discurso inteligível.
O clima é sempre tenso, tento descontrair com alguns pacientes que nos abordam, mas é muito dificil. São muitas pessoas diferentes, vivendo seus sofrimentos psíquicos, em seus mundos diferentes, com sua normas e volições próprias.
O jaleco nos dá a falsa impressão de proteção, de respeito, mas na verdade estamos apenas exercendo mais uma forma de poder sobre eles.
Os olhares estão embotados e perdidos, alguns narram perseguições sofridas, outros contam suas alucinações, e todos, sem excessão contam abusos sofridos na infância, pai espancando a mãe, abandonos. Tragédias duras, mas cotidianas da miséria humana.
Me sinto triste, muito triste...Vejo o quanto as atuais condições socias, econômicas e etc, contribuem para este adoecimento em massa, não há para onde fugir.
Por ironia do destino, o ônibus que nos levou ao hospital precisou ser trocado, ficou completamente sem freios.
Voltamos calados e pensativos. Alguns tentam contar algum fato engraçado ocorrido na tentativa de aliviar o clima, mas não dá...quem conhece a vida ali dentro, não sai de lá sem se afetar, afinal a linha é muito tênue, quase não se vê.
e eu...? continuo humildemente na minha corda bamba.

4 comentários:

Rafael Pinheiro disse...

eu já tive essa experiência. inclusive escrevi um texto sobre isso para a cadeira de psicopatologia na época. tentarei encontrar. no texto, tento dar conta da angustia que senti ao ver a miséria humana no Real.
é doloroso...muito doloroso.

Anônimo disse...

eu nem tava lá..mas deu pra sentir que foi pesado o negócio..só quero ver se eu num vou cair da minha corda bamba semana que vem, quando tiver que dar de cara com todo esse sofrimento..pelo menos posso tentar me esconder atrás do jaleco..
um beijo da tua colega de grupo mais "normal" ;P

Claudio Costa disse...

Entre a loucura e a sanidade há muito menos distância que se pretende. Muitas vezes a 'diferença' está mesmo no jaleco branco ou na chave da enfermaria (pois quem veste um ou carrega outra é feito da mesma matéria). Em tempo: valeu a citação da entrevista do Freud.

Anônimo disse...

Quer aprender a lidar melhor com a frustração? Seus problemas acabaram!! Estágio nos hospitais psiquiátricos Tabajara!!

É isso aí menina...Eis um espaço onde nos confrontamos com a frustração e com a impotência. Você escreveu:"...o jaleco nos dá a falsa impressão de proteção, de respeito", acrescento, afirmando que o jaleco também serve para nos diferenciar:quem é paciente e quem é "doutor", pois como você escreveu, os limites são tênues...!